sexta-feira, setembro 19, 2008

Para olímpicas...

Desde criança eu escuto que o que importa é competir. Este tal espírito esportivo nos daria imenso prazer em participar das atividades lúdicas ou esportivas, independente da classificação ou prêmio. No entanto, o que todo mundo queria mesmo era ser o mais forte, mais rápido ou mais inteligente.

Assistindo as olimpíadas, rememoro o espírito esportivo, associado àquela definição grega da dieta. A noção era equilíbrio do corpo com a mente: adquirir bons hábitos, evitar vícios e extravagâncias, favorecer a criação de grupos, trabalho em equipe, bem estar do corpo. E neste contexto, alcançar a auto-superação, dentro dos limites fisiológicos.

Quem convive com atleta sabe que esta realidade mora longe. São músculos trabalhados ao extremo, articulações repetidamente lesionadas, ligamentos rompidos, vida social e familiar avassalada, ego inflado e competitividade estampada. O que, muitas vezes, promove a fulguração de estrelas dentro da mesma constelação.

A despeito das lesões: é lindo! Inegavelmente lindo. As olimpíadas mobilizam e imobilizam todo mundo, de todas as idades. É um espetáculo de beleza, força, velocidade e equilíbrio. Toda a mídia divulga repetidamente. Inclusive quem não patrocinou nada faz propaganda às custas dos atletas.

Termina as olimpíadas, começam as para-olimpíadas. Não se pode negar que é uma grande conquista.

Supõe-se que o individuo reabilitado é uma pessoa saudável portadora de uma seqüela. E a reabilitação desportiva é a continuidade deste processo. Mas como todo mundo sabe, a maioria esmagadora dos deficientes passa longe da reabilitação. Na minoria esmagada e reabilitada, outra minoria mais minoritária ainda tem acesso à reabilitação desportiva. E uma ínfima fatia desta finíssima fatia tem oportunidade de competir. A maioria banca as próprias despesas até para ir a um evento como este.

A despeito disso, estes para-atletas têm conseguido mais medalhas, inclusive de ouro, que os atletas ditos normais. E obviamente que nos tempos da ditadura da beleza, eterna juventude e império das aparências, as para-olimpíadas já não têm o glamour da anterior. A mídia e a tevê aberta apenas cita as conquistas olímpicas destes atletas que trazem seus defeitos estampados na cara.

Mas hoje de manhã, ligo a TV: bom dia Brasil. Escuto a citação de uma nova medalha para-olímpica, seguida de uma evocação ao brasileirão com exibição dos lances e gols da última rodada.
Retomo o conceito de disciplina espartana dos nossos outros atletas, muito mais profissionais que estes jogadores. São os poucos multi-patrocinados e mega-remunerados, que servem de ídolos e referências às nossas crianças. A despeito disso, são frequentemente envolvidos em escândalos e raramente tem alguma preocupação social.

Basta citar o renomado fenômeno, que seria melhor classificado no reino vegetal: reserva a inteligência de uma planta (inviabilizando diferenciar um travesti de uma mulher) e está redondo como um vaso desde a copa de 2006.

E do outro lado, em meio a falta de acessibilidade, ao preconceito, a falta de patrocínio, e as medalhas de ouro – 16 medalhas de ouro... o espírito esportivo está muito mais para-olímpico que qualquer outra coisa.

Dedico este texto ao meu pai, que apesar de ser louco e vilão, é professor de educação física, e acredita na inserção das crianças e adolescentes na sociedade através da educação, física inclusive!