sábado, janeiro 30, 2010

OS RISCOS DA FELICIDADE

Outro dia, chegou-me um paciente com dor. Mas a dor era tanta que toda a família se reorganizou em torno dela. Cada um foi, solidariamente, adoecendo junto. Em seis meses, tava todo mundo doente.

O objetivo do tratamento dele era um só. Era tão desejado que era um sonho. E nem bem a proposta terapêutica foi feita, ele piorou absurdamente, mas tanto, que desistiu de se tratar.

Então chegou mais outro paciente, mais outro e depois outro. E ao fim do dia de trabalho, eu constatei: o ser humano suporta muita coisa ruim. As tragédias lotam os consultórios, igrejas e bares. Todos os tipos de desgraças.

São acidentes, abusos, doenças, abandono, desavenças, ingratidões, traições, falências, fracassos, derrotas, instabilidades, miséria, fome, privação de sono, dor e mais dor. Alguns chegam a ter um corolário delas.

Inegavelmente, a tristeza vende mais que a alegria. Vende mais música, filme, poesia, livro e bebida. Vende mais remédio, roupa, sapato e viagem. Vende mais seguro de saúde, de vida, de valores e de bens. Vende mais cigarros e drogas, incluindo as novelas.

No mundo, se somam as almas adoecidas pelo percurso da vida, quase sempre insalubre. Todo mundo é abatido de alguma forma.

Cumprimentaram o homem mais bem sucedido do convívio: “como vai?”. Aquela pergunta que nem obriga resposta. Mas ele respondeu, glorioso: “tenho mais que agradecer do que de me queixar”.

Pelo orgulho e imponência da resposta, deduzi que isso era um sinônimo de “estou bem”. Porque, provavelmente, ele percebeu que ser feliz chega a ser passivo de críticas.

Mas apesar das críticas. todo mundo almeja ser feliz. Um dia, claro. É o sonho coletivo. Sempre se está esperando algo pra ser feliz. Até que seja tarde demais para isso.

Alguns que você não sabe o que esperam para ser feliz, mas apostam na tristeza dos outros. A moça me disse que escolheu trabalhar no meio daquela miséria para saber que é feliz.

E eu que achava que felicidade era de sentir e não de saber...

Lá pelas tantas, escutei um relato curioso. Alguém perguntou a uma mulher como ela fazia para ter um casamento tão feliz. Ela respondeu, na maior, que de vez em quando tinha uns ataques e reclamava dele em tudo, pra ele não se acostumar com a felicidade.

Assim iam 10 anos de felicidade cotidiana patrocinada pelas tristezas dissimuladas... ou sei lá eu, o que era dissimulação.

Tem felicidade sai da boca, mas não entra no coração. Ainda mais hoje em dia, que ser feliz é pelo menos, ser suspeito de falsidade ideológica.

E se brincar, paga multa, aumenta imposto, alguma taxa destas... se quer ostentar a felicidade, que pague por ela! Porque a felicidade, muitas vezes, é insuportável.

Mas, a gente vai viver tentando!

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