sábado, janeiro 30, 2010

desculpas azuis

Escrevi para Saulo perguntando se ele tinha algum texto meu “das antigas”. Ele respondeu que tinha 35, mas que só dava se eu desse, em troca, parceria no livro – que eu nunca escrevi.

Enfim: muito otimista para quem é pessimista convicto.

Eu costumo dizer que cada um tem os amigos que merece. Eu respondi, malcriada, que ele é meu amigo mais “fuleiro”, no mais claro pernambuquês e que daí que ele mandasse, eu já teria netos.

Mas ineditamente, ele me mandou todos e no mesmo dia!

Tinha de tudo. Algumas pérolas que eu pensava perdidas, outras que eu nem lembrava ter escrito. Tinha até comentário de fórmula 1 - porque cara de pau nao foi feita pra dar cupim! Ele disse que foi divertido mandar. Nem precisa dizer o quanto foi divertido receber.

Então, tive que mudar a resposta e pedir desculpas.

Saulo é meu amigo há uns 15 anos. Eu vivia na casa deles durante a faculdade e residência inteira. Enquanto Vivian era a melhor amiga de Dani, Saulo era amigo e cúmplice de Hermengarda. Foi o primeiro a reconhecê-la em texto pelo “estilo literário”. E cita, sem delongas, várias situações em que fomos azuis – nem todas sóbrias, é bem verdade.

Quando ele brigava com todo mundo em casa, como um bom ariano, Vivian me convocava para “amansar a fera”. E quando eu chorava me sentindo o cristo do mundo, ele me tirava da cruz e dissolvia meu drama como se fosse um pó.

Como o espaço sideral não tem mosquito, a gente projetou uma casa na árvore, sem relógio na parede e com as janelas sempre abertas – para Herme chegar sem avisar.

Eu, ele e Vivian líamos vários livros. Mas era com Saulo que eu discutia horas a fio as entrelinhas do texto. Era meu companheiro de cinema também. Um dia o guarda da fundação fechou o cinema e teve que mandar a gente embora. Estávamos na porta, argumentando fervorosamente o fim do crocodilo de “adaptação”. Porque as nossas filosofias eram meio arianas também.

A gente também trocava música. Ele me apresentava umas, e eu explicava Zé Ramalho e Raul Seixas – praticamente como se eu tivesse co-autoria. Hoje, com meu radio com mp3, estou eu escutando os discos que ele gravou pra mim.

Era a Saulo que eu confiava minha embriaguez, fora de casa. E ele cuidava de mim com lealdade, até bebia menos para se responsabilizar. E teve uma festa que a gente foi “esperar Hermengarda chegar”, trazendo azul pro céu de novo, na beira da praia de Olinda, que fedia de tão suja.

Hoje em dia, Saulo é quase um são Pedro: chega sem avisar, uma vez por ano e dura menos de 24 horas. Mas apesar disso, a parceria ainda existe. Toda vez que tem alguma coisa importante na minha vida, eu nunca deixo de contar pra ele.

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