sábado, outubro 04, 2008

29 de setembro de 2008

O correio sideral reverencia o centenário da morte de Machado de Assis. Comemorar o aniversário da morte de alguém é celebrar o dia em que a pessoa virou fumaça. E este é um evento que muito me diz respeito.

Machado é um velho amigo, que há tempos não encontrava. Encontrei em São Paulo, no museu da língua portuguesa: aquele belíssimo espetáculo. É totalmente desnecessário falar da genialidade dele, das superações de tudo e da sua posição entre os melhores escritores. Isso muita gente já sabe, e quem não sabe, vai assistir ou ler nas tantas homenagens.

Eu prefiro falar de outra coisa: tem um filosófo que diz que a palavra escrita e a memória não conseguem apreender o real como ele se apresenta. Mas Machado consegue transcender esta apresentação do real, multiplicando suas possibilidades, quando convida o leitor, a cada chamada (caro leitor) a construir expectativamente uma nova realidade dentro da ficção.

"retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade de estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá a idéia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma forca que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros, mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me, tragar-me"

(capitulo XXXIII – olhos de ressaca – Dom Casmurro, 1899 – Machado de Assis )

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