sábado, agosto 16, 2008

quem me levar, eu torço

O futebol foi um esporte que nunca fez parte do nosso núcleo familiar. Meu pai não tem time e aproveita a copa para trabalhar sossegado. Mesmo assim, perto da minha mãe, ele é praticamente um torcedor fanático. Neste contexto, eu cresci incólume a esta paixão.
Meus amigos, às vezes, tinham algum time, mas era como uma citação sem qualquer efervescência. Durante muito tempo, a única coisa que eu entendia de futebol era quem era a bola.

Sempre tive a lucidez de entender que, com o montante de dinheiro que passou a rolar pelo futebol, ele deixou de ser um esporte para ser uma política como outra qualquer... e sempre achei muito aviltante tratar a paixão alheia com tanto mercantilismo – por isso, me compadecia destes apaixonados...

Na copa de 2002, meus colegas do plantão da sexta, Alexandre (santa) e Roberto(sport), tentaram incansávelmente me ensinar alguma coisa a respeito. Falavam, repetiam, contavam jogadas. Alexandre argumentava: "aprende, Dani, nem que seja pra você olhar as pernas dos jogadores". Toda semana, era a mesma arguição, com perguntas, repetidas, "explique com suas palavras". E eu olhava com aquele fastio desatento: "não adianta... vocês estão perdendo tempo... eu não vou aprender isso nunca..." ledo engano meu...

Na copa de 2006, graças a aposta que eu perdi, tive que assisti todos os jogos do Brasil. E Xande, um cara magnânimo, para minimizar meu tédio, passava o jogo me explicando as curiosidades das jogadas, dos lances históricos e dos craques (Garrincha, Nilton Santos, etc). Dizia que eu, como fisiatra, não podia deixar de ver estas coisas... assim, eu comecei a reconhecer algumas jogadas, o que me levou a achar Zidane o máximo...

Há um ano, comecei a conviver com vários torcedores apaixonados. É impressionante como crendice do torcedor se despe de qualquer raciocínio. Meu cunhado acha que um dos amigos dele não pode assistir o jogo no campo porque dá azar ao sport (time dele mesmo). Tiago usa sempre a mesma cueca pelo avesso pra dar sorte pro náutico (bem se vê que não funciona!). E minha irmã, apeser de ser uma torcedora por solidariedade, é convicta que o time que eu torcer, ganha.
Naquela convivência, comecei a sentir uma curiosidade incrível de ver o jogo. Sobretudo pelo relato de uma amiga: "é muito engraçado assisti a galera sofrendo por uma coisa tão insignificante". Meio mundo de gente se ofereceu para me levar, pela minha torcida infalível – porque um torcedor acredita na teoria do outro!

Então, fui ao jogo do sport x Ipatinga – que, obviamente, eu não fazia a mínima idéia de onde vinha. Ao chegar na casa dela, recebi logo a camisa do sport – já saí de lá fantasiada (porque a partir do momento que se nasce, já se tem o direito de ser cara de pau). Fomos eu, ela e Matheus.

A compra do ingresso já foi um espetáculo a parte. As pessoas corriam como enxame com cara de desespero a cada "colméia" que abria pra vender ingressos. Entramos no estádio, cheio de gente já. A torcida "jovem" amarela e vermelha era vibrante em luz, som e cor...

Subimos na arquibancada. Sentei estratégicamente do lado de Bel, para poder tirar minhas dúvidas. E antes de tudo, ela me perguntou: "o que é impedimento?" Tipo: chamada oral. Eu fui respondendo, com "minhas palavras". Ela me olha estarrecida: "Acertou! Passou pro estágio 2!".
Começou o primeiro tempo. A arquibancada ainda não estava cheia. Realmente é muito diferente da TV. É lindo. Toda jogada me interessava, independente do time. Muito embora o time sem torcida comovia meu coração. Bel percebeu minha empatia e me deu aquela enquadrada: "não vai torcer pelo Ipatinga não, heim Dani!"

Com o tempo, eu, que achava que o maior espetáculo ia ser o sofrimento e a alegria da platéia, já estava me levantando para ver as jogadas. Comecei a reconhecer as faltas antes de Bel me explicar. Ela ia comentando as regras, e eu assimilando tudo: praticamente uma futebóloga – dentro do meu contexto, obviamente...

"Dentro do meu contexto" significa que, dentre outras coisas, eu não entendia as piadas e nem sabia se sabiá era o nome do jogador ou um xingamento. E ainda morria de rir com um leão, totalmente disneilândico, que desfilava ao redor do campo provocando delírios na platéia...

A medida que a arquibancada encheu, o sentimentalismo dos corações adjacentes contagiaram o meu – na verdade, eu tenho muito talento para solidarizar-me com o sentimento alheio. É como bloco de carnaval: quanto mais alto toca, mais o coração bate forte.

Aí terminou o primeiro tempo, e nada de gol. Eu já comecei a ficar indignada porque eu estava torcendo e nada – ou seja, eu já estava acreditando na teoria de torcedora de minha irmã.
Primeiro gol! Eu pulei loucamente, me abracei com Bel! Com Matheus! Lindo! Estávamos confiantes quando os ipatinguenses, a quem eu, a estas alturas, já chamava de "inimigos", fizeram um gol. Sofrer eu nao sofri não, mas fiquei indignada!

Então a apreensão (beirando o sofrimento) já se expressava em todo meu corpo! Já fazia coreografia, batia palmas, fazia "ola"... Teve um pênalti! Eu reconheci (que orgulho de mim mesma!). Vai bater o penalti. Tive até taquicardia! Mais um gol!

Agora era eu a contar os minutos... e como o limite da cara de pau é o céu, me incoorporei à massa de técnicos da arquibancada e comecei a emitir opiniões – imagina... observei que, além dos técnicos, a arquibancada tem é cheia de filósofos... a platéia realmente tem seus encantos...
Mais um gol! De Ciro, em seu primeiro jogo! Que coisa linda! E pouco depois, o jogo terminou!

Saimos (olha eu ai, aderida!) vitoriosos... sport 3x1! Ai fui aprendendo que depois do jogo, se liga
o rádio para ver os comentários do jogo, depois, os depoimentos dos jogadores... Muita filosofia: é preciso blindar psicologicamente Ciro para não prejudicar sua "profissionalidade".

Enfim: comunico a todos que participei veemente de todos os momentos do jogo! E me diverti muito. Em tempos de paixães superficiais e ideologias apáticas, o futebol continua arrebentando corações... pena que é só esta camisa que se veste assim... mas eu confesso que continuo lucidamente sem time, e vou fundar um bloco: "quem me levar, eu torço!"

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